Facapa

O Meu Olhar

O meu olhar é nítido como um girassol.
Tenho o costume de andar pelas estradas
Olhando para a direita e para a esquerda,
E de, vez em quando olhando para trás…
E o que vejo a cada momento
É aquilo que nunca antes eu tinha visto,
E eu sei dar por isso muito bem…
Sei ter o pasmo essencial
Que tem uma criança se, ao nascer,
Reparasse que nascera deveras…
Sinto-me nascido a cada momento
Para a eterna novidade do Mundo…

Creio no mundo como num malmequer,
Porque o vejo. Mas não penso nele
Porque pensar é não compreender …

O Mundo não se fez para pensarmos nele
(Pensar é estar doente dos olhos)
Mas para olharmos para ele e estarmos de acordo…

Eu não tenho filosofia: tenho sentidos…
Se falo na Natureza não é porque saiba o que ela é,
Mas porque a amo, e amo-a por isso,
Porque quem ama nunca sabe o que ama
Nem sabe por que ama, nem o que é amar …
Amar é a eterna inocência,
E a única inocência não pensar…

{Alberto Caeiro} – O Guardador de Rebanhos – 08/03/191

Prof. Dr. Renato Kirchner

III Jornada de Filosofia

Prof. Dr. Renato Kirchner é Doutor em Filosofia pela Universidade Federal do Rio de Janeiro (2007), mestre em Filosofia pela Universidade Federal do Rio de Janeiro (1999), graduado em Filosofia pela Universidade São Francisco (1991). Atualmente, é professor doutor da Universidade São Francisco, atuando nos cursos de Educação Física, Tecnologia em Logística e Administração. De 1992 a 1994 cursou Teologia no Instituto Teológico Franciscano (ITF), Petrópolis. Concursado, em 1997, como professor substituto na área de Metafísica e Filosofia Contemporânea do Departamento das Filosofias e Métodos da Universidade Federal de São João Del Rei. Trabalhou nos departamentos editorial, de editoração e de desenvolvimento gráfico da Editora Vozes de 1992 a 2002. Desde 2003 é editor-coordenador da Editora Universitária São Francisco (EDUSF). Sócio da Associação Brasileira de Estudos Medievais (ABREM) desde 2005 e representante da EDUSF na Associação Brasileira de Editoras Universitárias (ABEU) desde 2003. Tem experiência na área de Filosofia, com ênfase em Teoria do conhecimento, Metafísica, História da Filosofia, História das Idéias modernas e contemporâneas, atuando principalmente nos temas: tempo, temporalidade, história, historicidade, antropologia e sociologia contemporâneas, teologia, franciscanismo, medievalística. Tem ampla experiência profissional de editoração e produção cultural. É conselheiro ad hoc da revista Educação e Filosofia, da Universidade Federal de Uberlândia. Pertence ao grupo “Filosofia e franciscanismo”, na linha de pesquisa “Filosofia, teologia e espiritualidade franciscana” e ao grupo “Franciscanismo e medievalísticado”, na linha de pesquisa “Tradição humanística, filosófica, teológica e espiritual do franciscanismo”, vinculados ao Instituto Franciscano de Antropologia (IFAN), sob coordenação de Alberto da Silva Moreira. Desde 2003, juntamente com Enio Paulo Giachini, coordena a col. Pensamento Humano, anteriormente coordenada por Emmanuel Carneiro Leão e editada pela Vozes. Para mais informações, clique aqui.

Uma espécie de perda

Uma espécie de perda

Usámos a dois: estações do ano, livros e uma música.
As chaves, as taças de chá, o cesto do pão, lençóis de linho e uma cama.
Um enxoval de palavras, de gestos, trazidos, utilizados, gastos.
Cumprimos o regulamento de um prédio. Dissémos. Fizémos. E estendemos sempre a mão.

Apaixonei-me por Invernos, por um septeto vienense e por Verões.
Por mapas, por um ninho de montanha, uma praia e uma cama.
Ritualizei datas, declarei promessas irrevogáveis,
idolatrei o indefinido e senti devoção perante um nada,

(- o jornal dobrado, a cinza fria, o papel com um apontamento)
sem temores religiosos, pois a igreja era esta cama.

De olhar o mar nasceu a minha pintura inesgotável.
Da varanda podia saudar os povos, meus vizinhos.
Ao fogo da lareira, em segurança, o meu cabelo tinha a sua cor mais intensa.
A campainha da porta era o alarme da minha alegria.

Não te perdi a ti,
perdi o mundo.

{Ingeborg Bachmann}, “O tempo aprazado”

Diario de Bordo – 03

      Sem muito sentido, palavras jogadas ao vento, uma seqüência quase ilógica, mas que no fim fica muito bom. Não não estou falando de Beckett, estou falando do Diário de Bordo (=
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Poesia

     ”A poesia tem um papel na cultura, como a matemática e a música. Ela estabelece talvez um plano original no mundo do pensamento e imaginação, plano de síntese das forças espirituais, ponto onde todos os trabalhos do homem, o seu esforço e história, se unificam no súbito conhecimento de uma grande realidade: a vida do ser humano sobre a terra. Considero que todas as formas expressas da imaginação se concluem na verdade poética. O teorema de Pitágoras, a invenção da roda e do parafuso, a descoberta do arado, a ideia da igualdade dos homens, as astronaves, a arquitetura funcional, a revolta contra os tiranos – tudo isso em que a civilização se aplicou, e foi e é um degrau imaginado no percurso para um tempo melhor, encontra a sua beleza ao atingir o poema. E o ofício daqueles que procuram revelar aos homens a beleza dos seus próprios atos não pode ser inútil, porque talvez se não lutasse tão ardente e pertinazmente, se não se possuísse a consciência da beleza da luta. É este papel que, quanto a mim, se destina à poesia. Assim, ela liga-se à história, reflete-a na sua forma pura, fulminante.”

{Herberto Helder}
Extrato do artigo Ofício de Poeta, publicado na Revista êxodo – Coimbra 1961.

Beckett

     Pois é! Na falta temporária da nossa amiga Sueli, coube a mim a tarefa de relatar um pouco sobre a conferência “Beckett e a desintegração da linguagem” apresentada pelo Prof. Dr. Lauro Baldini nesse terceiro dia da III Jornada de Filosofia da Faculdade Católica de Pouso Alegre.
     Difícil falar sobre alguém que, categoricamente, afirma não ter nada a dizer. Assim se declara Samuel Beckett.
     Mas, como este homem extremamente versátil, que produziu romances, peças, programas de rádio, contos, novelas e até um filme, pode ser associado à desintegração da linguagem? Apesar de não acreditar na palavra, escreveu incessantemente e, com a sua literatura da “des-palavra”, ganhou o prêmio Nobel de Literatura em 1969. Acha paradoxal?

     Pois então leia a trilogia romanesca de Beckett: “Molloy”, “Malone Morre” e “O Inominável”. Ele garante serem correlatas entre si. Talvez o que as une (e isso são considerações minhas) seja a ordem decrescente das mesmas em relação aos elementos. Na primeira, dois personagens. Na segunda, apenas um. Na terceira, o inominável. Não existem tramas, cenários, enredos, heróis… nada. Essa é a palavra: NADA! Beckett gira ao redor do nada de forma tão magistral que, não raro, nós, leitores, nos vemos no centro de suas obras.
     Mais uma vez paradoxal? Claro! O quê você espera de um homem que diz:

“Não tenho nada a dizer, mas somente eu sei como dizer isto.”

Palavras de Beckett…

Escrito por: Ana Flavia – 2º Período de Filosofia

Fotos Terceiro dia…

Beckett… Trechos

O Inominável

“Procurei por todo lado. E todas essas perguntas faço a mim mesmo. Não é por curiosidade. Não Posso calar-me. Não, nem tudo é claro. Mas o discurso tem de ser feito.”

“É o fim que é o pior, não, é o começo que é o pior, depois é o meio, mas depois é o fim que é o pior, essa voz que é cada instante, que é o pior… é preciso continuar ainda um pouco, é preciso continua ainda muito tempo, é preciso continuar ainda sempre…”

“Eu sou em palavras, eu sou feito de palavras, palavras dos outros. Eu sou todas estas palavras, todos estes estrangeiros, esta poeira de verbo. E preciso dizer palavras enquanto elas estão aí (…) é preciso tentar logo, com as palavras que restam.”

“não posso continuar, vou continuar”
“Je ne peux pas continuer, je vais continuer”
“I can´t go on, I’ll go on”
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Prof. Dr. Lauro Baldini

III Jornada de Filosofia

Prof. Dr. Lauro Baldini possui graduação em Letras, fez Mestrado e Doutorado em Lingüística na UNICAMP, sob a orientação da Profa. Dra. Eni Orlandi. Sua área de atuação é a Análise de Discurso, com ênfase na articulação entre esta disciplina e os campos do marxismo e da psicanálise. É membro da Associação Brasileira de Lingüística (ABRALIN) e do Grupo de Estudos Lingüísticos de São Paulo (GEL). Atualmente, coordena o projeto de pesquisa Discurso e subjetividade: o dizer do mal-estar (UNIVÁS) e participa como pesquisador de dois projetos: História das Idéias Lingüísticas (UNICAMP) e Discurso, Memória e Processos Identitários (UNIVÁS). É professor-colaborador do curso de Mestrado em Lingüística da UNIVÁS, diretor-executivo do Instituto 14 Bis de Educação e Cultura e membro do Comitê de Redação da revista Línguas e Instrumentos Lingüísticos , da Editora Pontes. Para mais informações, clique aqui.