Resumo

Este artigo faz breves referências a algumas teses importantes de uma das obras mais importantes de Santo Agostinho: O Livre-Arbítrio (De Libero Arbitrio). Este livro, terminado no ano de 395, foi realizado em forma de diálogo com Evódio, seu amigo e conterrâneo, e tem como tema o problema da liberdade humana e a origem do mal moral.

Introdução

Aurélio Agostinho (em latim: Aurelius Augustinus), Agostinho de Hipona ou Santo Agostinho, nasceu em Tagaste, no dia 13 de novembro de 354, e faleceu em Hipona, 28 de agosto de 430. Foi escritor, teólogo, filósofo, padre, bispo e Doutor da Igreja Católica. Santo Agostinho é uma das figuras mais importantes no desenvolvimento do cristianismo no Ocidente. Em seus primeiros anos, Santo Agostinho foi fortemente influenciado pelo maniqueísmo e pelo neoplatonismo de Plotino, mas depois de sua conversão e batismo (387), ele se utilizou de sua extraordinária capacidade de discernimento e pensamento para desenvolver métodos filosóficos e teológicos de acordo com a doutrina divina. Ele aprofundou o conceito de pecado original dos padres anteriores e, quando o Império Romano do Ocidente começou a se desintegrar, começou a desenvolver dois conceitos distintos de homem: o temporal, amigo das coisas materiais; e o espiritual, aquele que tem afinidade com os assuntos eternos. Com base nestas ideias, Santo Agostinho escreveu outra importante obra (A Cidade de Deus), a qual, a partir daquela época, passou a influenciar o modo de pensar e agir das comunidades cristãs de todo o mundo.
Desde a sua adolescência, Santo Agostinho se preocupava com as questões da liberdade humana e a origem do mal, e uma das causas de sua adesão ao maniqueísmo foi a esperança de aí encontrar uma solução para suas dúvidas. Contudo, as fábulas heréticas não o satisfizeram por muito tempo. Teve que prosseguir a angustiante busca da verdade, pois ele não podia suportar a ideia de que Deus fosse a causa do mal. A leitura do neoplatônico Plotino trouxe-lhe a luz tão desejada, todavia, ainda não fora uma resposta definitiva e plena, a qual Santo Agostinho só encontrou no cristianismo, quando ele retornou ao catolicismo.
A diferença entre os homens e animais: a razão

É no espírito que reside a faculdade pela qual nós somos superiores aos animais. E se eles fossem seres inanimados, eu diria que nossa superioridade vem do fato de que possuímos uma alma, e eles não. Mas acontece que também eles são animados. Contudo, existe alguma coisa que, não existindo na alma deles, existe na nossa, e por isso acham-se submetido a nós. Ora, é claro para todos que essa faculdade não é um puro nada, nem pouca coisa. E que outro nome lhe daríamos mais correto do que o de RAZÃO ? (Livro I, segunda parte, cáp. 7, 16).

Duas espécies de homens

Logo, é evidente que há duas espécies de homens: uns amigos das coisas eternas; e outros amigos das coisas temporais. Logo, a lei eterna ordena desapegar-nos do amor das coisas temporais e voltar-nos purificados para as coisas eternas. (Livro I, terceira parte, cáp. 15, 31 e 32).

A vontade livre – entre o Bem supremo e os bens mutáveis

Quando a vontade (do homem, o bem médio) adere ao Bem imutável (de Deus), o Sumo Bem, então o homem possui a vida feliz. (Livro II, terceira parte, cáp. 52).

A submissão ao Senhor livra-nos do poder do demônio

É porque o Verbo de Deus, o Filho único de Deus, que sempre teve e sempre terá o demônio submetido às suas leis, tendo se revestido de nossa humanidade, submeteu igualmente o demônio ao homem. Para isso, nada lhe exigiu com violência. Mas venceu-o pela lei da justiça. Posto que o demônio, tendo enganado a mulher e feito cair o homem por meio dela – certamente animado pelo desejo perverso de causar dano, entretanto com todo direito -, pretendia submeter à lei da morte todos os descendentes do primeiro homem, a título de pecadores.
Em consequência, esse poder não deveria perdurar senão até o dia em que o demônio poria o Justo [JESUS] à morte, Àquele em quem nada podia encontrar digno de morte. E Ele, não somente foi condenado à morte, sem crime algum, como também nasceu sem concupiscência alguma, pela qual o demônio subjugava a todos os seus cativos, como frutos de sua árvore. Isso sem dúvida levado por um desejo muito perverso. Não obstante, sem lhe ter faltado certo direito de propriedade. Por conseguinte, é com toda justiça que o demônio está constrangido a libertar aqueles que creem naquele a quem submeteu à morte injustamente.
Desse modo, se os homens morrem de morte temporal, que essa morte seja para liquidar sua dívida; e se vivem da vida eterna, que seja para viver naquele que pagou por eles uma dívida que ele próprio não tinha.
Para aqueles, porém, a quem o demônio tiver persuadido de perseverar na infidelidade, com direito ele os terá como companheiros na danação eterna.
Assim, pois, aconteceu que o homem não foi arrancado por violência ao demônio, tal como este não havia se apropriado por violência ao homem, mas por persuasão. Dessa maneira, foi submetido o homem que com direito havia sido humilhado, a ponto de se tornar escravo daquele a quem dera o consentimento para o mal. Com direito, também foi liberado por Aquele a quem dera consentimento para o bem. Isso porque o homem fora menos culpado consentindo ao mal do que o demônio a persuadir a fazê-lo. (Livro III, segunda parte, cáp. 10, 31)

Nossa situação atual, devida ao pecado original

Acontecem certas ações que mesmo cometidas por ignorância foram condenadas, com a obrigação de serem reparadas. Lemos nas Sagradas Escrituras o Apóstolo dizer: “Obtive misericórdia porque agi por ignorância” (1 Tm 1,13). E o rei-profeta: “Não recordes, o Senhor, meus desvios da juventude e os meus pecados por ignorância” (Sl 24,7).
Existem também ações condenáveis, ainda que praticadas por necessidade. Isso quando o homem pretende agir bem e não consegue. Pois de onde viriam estas palavras: “Não faço o bem que eu quero, mas pratico o mal que não quero?” E estas outras: “Pois o querer o bem está ao meu alcance, não, porém, o praticá-lo” (Rm 7, 18-19). E ainda: “A carne tem aspirações contrárias ao espírito e o espírito contrárias às da carne. Opõem-se reciprocamente, de sorte que não fazeis o que quereis” (Gl 5,17)? (Livro III, terceira parte, cáp. 18, 51).

A origem das almas – Deus é sempre justo

Em seguida, se supusermos que Deus criou uma só alma, da qual tiraram sua origem as almas de todos os homens que nascem, quem poderia negar não ter cada homem pecado, ao pecar o primeiro homem? (Livro III, terceira parte, cáp. 20, 56)

O orgulho – principal fonte de toda má opção

“O orgulho é o começo de todo pecado” (Eclesiástico 10,13). “O início do orgulho humano é afastar-se de Deus” (Eclesiástico 10,12).
Foi esse o pecado do demônio que acrescentou a inveja, a mais odiosa, até persuadir ao homem esse mesmo orgulho, em razão do qual ele tinha consciência de ter sido condenado.
Visto que o demônio apresentou-se ao homem como exemplo de orgulho, o Senhor apresentou-se a nós como exemplo de humildade e com a promessa de vida eterna (Livro III, terceira parte, cáp. 25, 76).


REFERÊNCIA BIBLIOGRÁFICA

AGOSTINHO, Santo, bispo de Hipona, 354-430. O livre arbítrio. [tradução, organização, introdução e notas Nair de Assis Oliveira; revisão Honório Dalbosco]. São Paulo: Paulus, 1995. [Patrística].


Rogério de Paula e Silva
Quinto Período de Filosofia